quinta-feira, 3 de outubro de 2013

UMA GERAÇÃO DE SEM-GRAÇAS


perdoe a formatação do texto, foi publicado primeiramente no Facebook e transferido para cá.

            Quando fazia algo de errado ou que, na maioria das vezes apenas eu achava engraçado, minha mãe dizia que eu estava sendo sem graça, ou fazendo “semgraceira”. Criança respondendo aos pais era uma semgraceira; gritar era uma semgraceira; criança se jogando no chão do supermercado era uma semgraceira e fazer semgraceiras na escola era algo digno de várias varadas com galho de goiabeira dentre as mais variadas modalidades de se apanhar, cultivadas em abundância quando eu era criança.
         Na escola, eu era orientado por meus pais a ficar longe dos sem-graça. Gente que não fazia tarefa, respondia professor, falava palavrão... esses eram sem-graças e eu não deveria andar com eles. A impressão que tenho, é que há não muito tempo atrás, enquanto ia à escola, os sem-graças eram poucos, ou ainda, contidos. Hoje eu estou do outro lado da carteira, sou professor, e me parece que surgiu, de repente, toda uma geração de sem-graças mais forte e em maior número que os raros não-sem-graça. E sim, minha mãe ainda não me quer junto aos sem-graça e já me sugeriu trocar de profissão. Este texto, caro (a) leitor (a), era pra ser um vídeo. Era pra ser mais bem humorado. Mas ao recolher material suficiente para isso, comecei a reparar que a condição do professor não tem a menor graça... Este é um texto sem graça e você ainda está em tempo de parar sua leitura por aqui! E acabei preferindo um texto a um vídeo, pois, bem sei que poucos o lerão. Gente que raramente passa por aqui apenas para comentar uns “kkkkkkkkkks” vez em quando, dificilmente lerá este texto até o final. É mais comum notícias de alunos rebaixando seus mestres em todos os níveis, fotos no Facebook com as legendas de “aula saco”, depreciações públicas da figura do professor do que professores surtando e virando a mesa. Se este é meu primeiro texto que você lê, não se escandalize; tenho o humor nordestino correndo cá nas artérias, tenho a “alegria do Senhor”, que é minha força e, não obstante, sou grande admirador do humor satírico inglês, mas escrevo sobre uma piada que é um beócio.
        Honestamente, em algumas escolas parece que vejo crescer a geração mais parva, desrespeitosa e gratuitamente arrogante que meus olhos já viram e, pra ser mais honesto, isso me deixa com medo da minha velhice! (Não quero chegar ao mesmo nível, mas, caso tenha achado pesados demais os adjetivos, talvez não saiba o que já ouvi em sala de aula sobre meus colegas de trabalho e sobre mim mesmo). Parece ser muito engraçado ter alguém que fica solitário, num eterno “Todos contra um” como objeto de piada e zombaria. Parece que a depreciação do professor em sala de aula se tornou um hobbie, um entretenimento necessário e indispensável para o cotidiano de quem está na escola para qualquer outro fim que não seja estudar.
        Hoje, no mesmo dia em que escrevo este texto, percebi que cometi um erro terrível: Dei aula. Pois é - Era a segunda vez em que entrava em uma sala para dar aula e lá havia uma aluna que ainda não me conhecia, pois havia faltado na primeira aula. A título de informação, estou falando de alguém entre seus 25 ou 27 anos – lá parti para o giz, quadro, quando ouço alguém dizendo:

- Oi... alô... qual era o nome daquela cor que você pintou meu cabelo? 

         Quando olho para trás, havia alguém ao celular. Uma outra aluna ao celular perguntando isso... num daqueles momentos em que você realmente demora a acreditar que está de fato acontecendo. Pedi para que desligasse e, depois de saber a cor, ela desligou. Passados alguns minutos, a primeira aluna que mencionei disse:

- Disseram que sua aula era legal... mas tô (sic) vendo que não é não! 
- Ah é?! Defina uma aula legal!
- Ah... o senhor deveria sentar aí, rir mais com a gente, conversar mais com a gente. 

       Enquanto ainda digeria esta última, passados uns cinco minutos, esta mesma aluna leva o celular a orelha e eu digo:

- Na minha aula não, por favor! 
- Vou embora! Você é um chato e sua aula é chata! 

          E foi aí que vivi um daqueles momentos em que você não sabe se chora ou gargalha como a Adele! A personagem não assistiu vinte minutos de minha aula, passou quase dez conversando do lado de fora, falou ao celular, não copiou toda a matéria e eu, que estava fazendo o que sou pago para fazer, estava dando uma aula chata, ou chata apenas por, de fato, ser uma aula.
           Apesar de com frequência ouvir que a educação brasileira está uma palhaçada, não me conformo com a ideia de tornar a sala de aula num picadeiro. Sei que a escola é um ambiente estressante sim, sei que há muito que temos que melhorar, tento proporcionar um clima descontraído em minhas aulas por conta disso, mas me tornar um animador de palco e contador do último capítulo da novela, não! Na última sexta-feira não consegui terminar uma aula, aliás, propositalmente terminei mais cedo por não aguentar mais uma vez uma onda de um deboche nojento, onde não me seria possível terminar a aula com uma severa rouquidão (ah, aqui neste caso falo de gente entre seus 16, 17 anos que decide o futuro do país nas urnas ). Um escárnio alarve de gente que chega meia hora atrasada e leva como material escolar apenas um celular, que faz pilhérias pornográficas sem pudor, que atribui ao professor a culpa por sua própria indisciplina, displicência e irresponsabilidade, que se revolta quando “tem muita matéria” e que sugere apenas “um trabalhinho” para garantir “uma notinha” - e vale lembrar, estou falando apenas de escolas de uma cidade do interior de Mato Grosso do Sul.
            Geralmente, por trás do professor que você vê, existe uma família. Geralmente a professora que você vê em sala tem um marido, deveres de esposa e filhos. Geralmente, o professor que você vê tem esposa, deveres de marido, e filhos. E, normalmente, a aula que você vê é apenas o produto final de muitas horas de trabalho que este profissional teve para aguentar um descomedido desinteresse. Ele tem contas a pagar, também sente raiva, antes da sua escola provavelmente já, no mesmo dia, lecionou em umas duas outras escolas, também tem dor de cabeça, também pensa nas grosserias que ouviu e quando vocifera e grita, é porque já ouviu e tolerou muitas outras chocarrices bizarras antes do estopim chegar ao fim. “mimimi, mas você nunca fez nada com professor?” – Sim! E quem me conhece sabe que sou exímio imitador dos professores que tive e, se algum dia faltei com respeito a algum deles, nunca foi durante nenhuma aula.
             Ainda sou um professor verdolengo, ainda há muito o que aprender. E ainda estou nessa porque realmente acredito que a educação pode transformar vidas. Porque sinceramente acredito nos não-sem-graça que chamam a responsabilidade pra cima do peito e encaram seus deveres com seriedade, que frequentemente têm na boca coisas como “com licença”, “obrigado”, “por favor”, que não estudam só na escola e que trazem consigo a educação que os acompanha desde casa. Certa vez uma colega de trabalho me disse:

- Iiih Alex... Tem coisas que faço de conta que não estou ouvindo nem vendo. 

     E odiei a faculdade por não ter me ensinado esta habilidade. Ou seria esta habilidade adquirida/desenvolvida com o tempo? Será que o problema é se importar demais com alunos e pais (ah sim, os pais) que deliberadamente não se importam? Será que, para manter a paz, conservar o que sobra de sanidade e saúde é necessário apenas sentar e ver o circo dos sem-graça pegar fogo?
Somos uma autoridade na escola e na sociedade.
Uma autoridade como Cabo Citonho diante de Frederico Evandro!
Acho injusto considerar a educação pública brasileira uma palhaçada, pois se vê no picadeiro muito mais respeito e reconhecimento pela profissão do palhaço.
 Alex Sandro Bambil - esse professor chato!

segunda-feira, 22 de julho de 2013

quarta-feira, 10 de julho de 2013